Antes de escrever este texto, orei a Deus Todo-Poderoso com cada batida do meu coração e com todo o sentimento. Durante as minhas orações, pedi ao Todo-Poderosos que me desse forças - para suportar a mensagem que acabava de receber segundo a qual uma família de quatro membros que me acolhera no passado mês de Janeiro acabava de sucumbir, algures em Vanduzi, debaixo do fogo cruzado quando tentava ir a Gorongosa – e confirmasse a minha convicção de que este texto pode atingir o objectivo por que anseio, o de um presente feliz e um futuro ainda mais risonho. Precisamos de construir um templo da paz. Tenho uma grande admiração e consideração pelo Governo de Moçambique. Existe uma profunda simpatia e boa vontade para com a Renamo e a firme determinação de continuar, apesar das muitas divergências e obstáculos, a tentar estabelecer as pontes do diálogo. Congratulamo-nos ou deveríamos congratular-nos com contactos constantes, frequentes e crescentes nesse sentido. Na imprensa de hoje, há uma tendência de diabolizar uns inocentando outros, conforme a paixão política do interveniente o que leva ao extremar de posições. Todavia, é meu dever – e tenho a certeza de que vos desagradaria que eu não apresentasse os factos tal como os vejo -, dizia; é meu dever confrontar-vos com determinados factos acerca da presente situação.
A situação no Save em em Moxungue continua tensa, com os motoristas a condicionarem a circulação dificultando o trabalho das forças armadas. A Renamo está agora a tentar, agindo unilateralmente, construir aquilo a que eu chamaria a esfera renamista e todas as aldeias na Grande Gorongosa, em Chibabava e em Maringue estão sujeitas, de uma ou outra forma, não só à influência renamista, mas também a um controlo extremamente apertado, e em certos casos, crescente, por parte da Renamo. A partir de Gorongosa está a alastrar o comportamento policial. Somente a vila da Gorongosa, com as suas glórias imortais, está livre de ataques. Os homens da Renamo foram encorajados pelo seu líder a apoderarem-se ilegalmente de partes importantes do território florestal, e estão a ter lugar expulsões em massa de centenas de camponeses gorongosenses, maringuenses, chibabavenses, numa escala atroz e inimaginável. A sua produção agrícola é apoderada pelos homens armados da Renamo. Uma sombra desceu sobre o cenário tão recentemente iluminado pelo cessar-fogo que durava há vinte dias. Ninguém sabe o que a Renamo pretende fazer num futuro imediato, nem quais serão os limites, se é que existem, das suas tendências expansionistas. A situação presente deve forçar-nos a agir em prol das paredes da paz, uma acção que deve ser levada por todos os segmentos sociais iluminados: académicos, igrejas, sociedade civil e partidos políticos. Em nada nos ajuda diabolizar a Renamo ou o Governo perante a situação presente porque, como disse no passado, juntos podemos vencer o mais perigoso dos assaltos da história moderna, a batalha por uma paz permanente baseada na justiça.
Falei atrás, caros compatriotas, no templo da paz. Este templo tem de ser construído pelos moçambicanos de todas as cores. Todos devemos acreditar no propósito do outro e termos esperança no futuro do outro e compreensão para com as limitações do outro, para citar algumas belas palavras que aqui li há uns dias, «porque não poderemos trabalhar juntos numa obra comum, como amigos e associados?» Temos de partilhar as ferramentas da paz, aumentando a capacidade da diminuição das ferramentas da guerra. Talvez os exemplos do que já experimentamos ou retirámos da História antiga ou moderna nos ensinem que os blindados, os tanques de guerra e as armas por si só não podem garantir a segurança e a paz. Em vez disso, destroem o que a segurança e a paz construíram. As instituições universitárias devem organizar debates para apontar os caminhos para a paz. As igrejas devem organizar as vigílias para amolecer os espíritos duros que teimam em levar o país ao colapso moral. As organizações da sociedade civil devem organizar manifestações diversas em prol da paz. Os partidos políticos devem procurar mais aquilo que os une. Todos cabemos neste Moçambique, porque «na casa do meu Pai há muitas moradas». Na verdade, é isto mesmo que temos de fazer, senão o templo da paz pode não chegar a ser construído, ou, tendo-o sido, desmoronar-se-á, e nós revelar-nos-emos novamente impossíveis de ensinar e teremos de voltar, pela terceira vez, a tentar aprender na escola da guerra, agora incomparavelmente mais rigorosa do que aquela cujas consequências estamos a sentir.
A Idade das Trevas e a Idade da Pedra podem regressar nas asas cintilantes da nação, e os recursos naturais ora descobertos que poderiam agora fazer literalmente chover incomensuráveis vantagens materiais sobre todos nós podem provocar a nossa total destruição. Cuidado, digo-vos eu, o tempo é muito curto. Não optemos por deixar correr os acontecimentos até ser tarde de mais. Evitemos ridicularizar uma das partes em conflito para diminuir a animosidade. Uma contenção na linguagem. Este é o caminho da sabedoria! Mais vale prevenir do que remediar. Temos de, em todo o lado, defender o homem da subjugação pela força das armas para que possamos dotar todos os moçambicanos do poder dos valores e princípios que promovem a sublime condição da moçambicanidade. Não podemos alimentar fanatismos, pelo contrário, canalizemos todos os nossos esforços para a construção de uma grande fortaleza de paz, em vez de fabricarmos inimigos imaginários. Esta batalha não é só do Governo, nem é apenas a batalha da Renamo. É a batalha de cada um dos cidadãos cujo direito é viver em paz. É um compromisso de consciência e responsabilidade nos corações de milhões de moçambicanos. É isto que vinha dizer. A mensagem está entregue, Deus é minha testemunha.
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