sexta-feira, 26 de abril de 2013

Será o Desarmamento da Renamo uma Prioridade Nacional?

A atmosfera de ameaça que nos rodeia desmoraliza-nos os esforços de edificar o país que queremos. É bom assumirmos por vezes as nossas próprias culpas. Se pretendemos a vitória, temos que conquista-la. Assim, debaixo de ameaças, nunca a conquistaremos. Durante as nossas vidas, vimos por inúmeras vezes os moçambicanos, contra os seus desejos e tradições, contra argumentos cuja força é impossível não compreender, serem irresistivelmente arrastados para viverem com coração na mão receosos do retorno da guerra. Por inúmeras vezes tiveram alguns moçambicanos de enviar seus filhos para outros locais, ao encontro da paz. Decididamente, deveríamos trabalhar com determinação para uma pacificação geral do país, no quadro do que a opinião pública considera viável. Mas isto não passa pelo desarmamento forçado da Renamo. Nas circunstâncias actuais, nas quais a opinião geral parece tender a ver na polícia um instrumento de opressão do que de protecção, não é possível imaginar uma Renamo desarmada sem que muitas vidas sejam postas em causa. A Renamo tem a causa a defender e as causas, quase sempre, nunca morrem.
Por todo o país, estabeleceram-se alianças que operam em total união e absoluta obediência na linguagem às directivas que recebem do centro de decisão que pretende ver a Frelimo fora do poder. Por todo o país, são cada vez mais visíveis sectores descontentes com o status quo e recentemente foi firmada uma Santa Aliança (Liga dos Direitos Humanos, Imprensa independente e oposição) com bênção de alguns prelados cujos pronunciamentos constituem um desafio crescente. Ainda estamos na infância dos desafios e já tivemos factos sombrios de enumerar, mortos e feridos, além de danos materiais avultados. Os desafios de Moçambique não são os partidos políticos que estão sendo combatidos. Os problemas de Moçambique não são o desarmamento da Renamo nem as bandeiras do MDM. Os desafios de Moçambique resumem-se numa única palavra: pobreza. E esta, por sua vez, chama outra palavra: justiça. Seremos extremamente insensatos se não encararmos a pobreza e a justiça de frente enquanto há tempo e incluirmos todos os actores políticos no seu combate e na sua observância. Precisamos de abandonar as consequências para abraçarmos as causas da crise. Precisamos de coabitar politicamente nas diferenças.
As ameaças que a Renamo faz, longe de trazer efeitos negativos a sua imagem, são catalisadoras da mesma, o que mostra que há moçambicanos que depositam sua esperança nas ameaças, como única saída viável. Porquê? Sinto-me na obrigação de retratar a sombra que se abate sobre o país porque ainda tenho na mente uma impressão muito forte da situação em que vivemos no passado, sobretudo no começo da rebelião, e é-me doloroso compará-la com a que se verifica actualmente. Naquela época, havia grandes esperanças e uma certeza absoluta de que a guerra não teria lugar e que aqueles eram Bandidos Armados com os quais não se podia negociar. Hoje, quando os discursos e actores são os mesmos, não vejo nem sinto essa mesma confiança, nem sequer as mesmas esperanças, no turbulento país de hoje. Repudio a ideia de que uma nova guerra é inevitável. É por ter a certeza de que ainda temos o nosso destino nas mãos, nas nossas próprias mãos, e que temos o poder de salvaguardar o futuro, que senti o dever de falar agora, quando a ocasião e a oportunidade se me apresentaram. Trabalhemos juntos e cheguemos a um entendimento político duradouro.
Não acredito que a Renamo deseje a guerra. O que ela deseja são os frutos da Paz. O que aqui devemos considerar enquanto ainda há tempo, é a prevenção permanente da guerra e o estabelecimento, o mais rapidamente possível, de condições de liberdade e democracia efectiva de todos os partidos, sem excepção. As dificuldades e os perigos não serão eliminados se lhes fecharmos os olhos. Não serão eliminados se ficarmos à espera para ver o que acontece, nem praticando uma política de apaziguamento. Os desafios não serão eliminados enquanto a polícia continuar a invadir sedes de partidos políticos que são, por lei, propriedades privadas. O que é necessário é um acordo, e quanto mais for adiado, mais difícil será de obter e maiores se tornarão os perigos que nos ameaçam. Pelo que vimos nos recentes acontecimentos de Muxungue e dos madjermanes em Maputo, ficamos convencidos de que para a polícia não há nada que tanto admire como a força das espingardas, e de que não há nada que menos despreze do que o homem desarmado.
Por isto, por esta razão, não é válida a velha doutrina de que as coisas se resolvem por si próprias, bastando ter o poder de instrumentos de opressão. Não nos podemos dar ao luxo, se o pudermos evitar, de ter pouco espaço de manobra, dando azo à tentação de teste de força. Se os moçambicanos se mantiverem unidos, em estrita adesão aos princípios da Constituição, a sua capacidade para promover esses princípios será imensa e não é provável que alguém os incomode. Porém, se se dividirem e vacilarem no seu dever, se deixarem fugir estes anos tão importantes, poderemos todos ser vítimas de uma catástrofe. Da última vez, os atenciosos viram a guerra a aproximar-se e avisaram aos compatriotas e ao mundo, mas ninguém lhes prestou atenção. Até 1979, ou mesmo 1980, Moçambique poderia ser salvo do horrível destino que lhe coube, e todos nós poderíamos ter sido poupados às misérias que a guerra lançou sobre os moçambicanos.
Nunca houve, na história, uma guerra mais fácil de evitar actuando atempadamente do que a que acabou de desolar tão vastas áreas do país. Poderia ter sido evitada, na minha opinião, sem se disparar um único tiro, e Moçambique poderia ser hoje poderoso, próspero e honrado entre as nações, mas ninguém quis ouvir e fomos todos sugados, um a um, pelo terrível turbilhão. A decisão será nossa, mas de modo nenhum podemos deixar que isto volte a acontecer. Só o conseguiremos se agora, em 2013, neste ano de 2013, chegarmos a um bom entendimento com a Renamo e com outros partidos a todos os níveis, e mantendo esse bom entendimento por muitos anos. Não são as armas que fazem a guerra, mas a vontade. Há muitos meses que a roda do destino e o impulso da calma determinação dos moçambicanos avançam em direcção ao objectivo. Nestas últimas horas, o ritmo aumentou e já nada o pode parar. Não se trata apenas de um grupo em marcha para o seu objectivo, mas de 22 milhões de moçambicanos marchando atrás de seus líderes, esperançosos de verem concretizados os seus sonhos de um Moçambique melhor.
 
Pedro MAHRIC