Diz-se que se o MDM ganhar a ponta vermelha irá desnacionalizar tudo o que a Frelimo nacionalizou. As casas irão para os antigos colonos. A minha primeira incógnita é que não sei o que sucederá com os hospitais e os edifícios escolares que, mercê da nacionalização, permitem ao muçulmano, quanto ao ateu e ao próprio cristão fazerem uso deles sem formalidades nenhuns. Não foi por acaso que Lisboa, mais do que outra capital europeia, tornou-se no verdadeiro salão de jantares do Daviz Simango, o líder do galo. Chamar emoções para ganhar dividendos políticos é o que se deve aconselhar que homens de bem não se metam. Um alto espírito da nossa terra, referindo-se à origem do MDM, num artigo inserto há tempos num grande semanário de Maputo, o Domingo, designou por «criação dos tugas» e que os Simango são apenas a face moçambicana do movimento. Não me furto de citar um outro espírito local que referindo-se aos passeios dos líderes do Galo em Portugal disse: «… os encontros não tinham como participantes os moçambicanos por lá radicados, mas sim os ex-colonos e o manifesto foi a promessa de devolução dos imóveis por estes deixados aquando da independência de Moçambique, o que valeu inúmeros apoios ideológicos e monetários, algo que similarmente aconteceu nos outros países, porém, ai com promessa de partilha dos recursos naturais de Moçambique».
Nesse artigo, o seu ilustre autor, mostra-se em desacordo com a propaganda do MDM para angariar fundos com promessas absurdas, e também nós, dentro do modesto valor da nossa opinião, a consideramos, por virtude até de moralidade que promove, se não inconveniente, pelo menos, pouco aconselhável traze-la a público na hora actual em que as feridas da colonização ainda sangram. «Aguas passada», como esclarecidamente observa o artigo a que nos referimos, «não movem moinhos». Com efeito, é evidente que hoje não se pode falar de devolver as casas nacionalizadas aos ex-colonos. Muitas delas já não estão em condições e já foram alienadas. A nossa política não pode ser condicionada pelas atitudes gravosas que outras nações tiveram para connosco em épocas já agora remotas. Para nos nortearmos na escolha do rumo a seguir não precisamos negociar a venda do país porque, só as realidades da hora presente e as perspectivas mais lógicas do futuro são de ponderar e ter em conta. Ninguém deseja, no seu justo estado de razão, regressar ao colonialismo. Há outras compensações que poderiam ser equacionadas para com os ex-proprietários das vivendas cuja propriedade é inquestionável. E isto, a própria Frelimo poderia ter em conta nas suas discussões. É preciso frisar que o povo moçambicano não foi vítima dos portugueses, proprietários de muitas propriedades no solo pátrio, mas do regime colonial enquanto sistema de dominação. Por isso, não nos podemos colocar no lugar de vítima, para justificar o fracasso na tomada de posição em relação ao que foi nacionalizado, fruto do suor de muitos humanos cujo erro foi suar numa terra longínqua.
A segunda incógnita é o que o MDM pensa sobre a Educação. Não concordando com o actual modelo promovido pela Frelimo que permitiu tornar muitos moçambicanos em cidadãos através da educação para todos, este partido diz que irá entregar parte das responsabilidades aos bancos privados, de modo a financiarem os estudos dos particulares. Ora, sabido que a banca moçambicana tem das mais elevadas taxas de juro no mundo, como tal será possível? As nossas universidades estão cheias de pessoas acima dos 35 anos, pelo que os bancos dificilmente poderão conceder créditos para essa finalidade. Mais uma vez, o MDM navega em pântanos, importando modelos desajustados com a realidade. Acima da afeição ou desafeição que acaso nos inspirem outros povos, e, por isso mesmo, muito acima das questões sentimentais suscitadas pelo desejo de «bem governar», aliás, de apaixonarem e dividirem os homens pacíficos, deveremos colocar sempre o interesse nacional baseado na realidade local. A própria desorientação absoluta em que vive o MDM, a respeito do dia de amanhã, recomenda que Moçambique e os moçambicanos imponham a si mesmos uma descrição de que, por certo, não poderá advir-lhes mal, nem terão que arrepender-se pelo que até aqui já foi feito em matéria da educação. Tem-se visto que pessoas preparadas dentro deste sistema de ensino questionam com argumentos sólidos a qualidade de ensino em que se formaram. Caso para perguntar, de onde vêm as suas sábias interpretações da má qualidade do ensino se elas reconhecem-se bem formadas? Este não é problema do regime, mas da sociedade como um todo.
A propósito, e como ponto final nestas considerações, diremos ainda que continua a parecer-nos difícil sustentar-se à luz dos factos, vistos com exactidão, uma educação com qualidade quando a quantidade dos que a necessitam ultrapassa grandemente os meros desejos dos políticos «que pensam nas eleições». Há combinações secretas que mais duma vez tendem a cair sobre Moçambique e representam ameaça de desrespeito pela nossa soberania e é conveniente não se esquecer que foram, sobretudo, o servilismo cego e má cabeça que o tornou possível e lhe deu alento, a causa do nosso atraso. Não regressemos nunca ao servilismo desastroso que, por muito tempo, motivou que o nosso país fosse objecto de negociações secretas nem reincidamos nas manifestações de má cabeça que em alguns passos da História nos trouxeram amarguras e vicissitudes, e poderemos, assim, confiar em que, terminado o período eleitoral, a nossa escolha não venha a criar-nos dissabores nem arrependimentos. Disse!
Pedro, MHRIC