segunda-feira, 22 de julho de 2013

O princípio de Paridade: um perigo para a Democracia em Moçambique

Observam-se esforços convulsivos, por parte da oposição e dos seus agentes na imprensa dita «livre», no sentido de encontrarem os argumentos políticos ideais em defesa da Comissão Nacional de Eleições (CNE). Desses argumentos, destaca-se particularmente o princípio da Paridade, defendido pela Renamo, segundo o qual a CNE deve compor-se de membros de partidos políticos com assento parlamentar em igualdade numérica. A falsidade e a hipocrisia de tal argumento, repetido em milhares de formas na imprensa oposicionista, são evidentes para todos os que não querem atraiçoar o princípio fundamental da democracia: a proporcionalidade. Temos três partidos políticos na Assembleia da República entre os quais dois estão na oposição. Suponhamos que haja uma CNE composta por 15 membros. Ora, seguindo a paridade, à partida, a soma dos dois daria uma vantagem numérica à oposição, isto é, no cenário em que cada partido possua 5 membros, a oposição teria, no conjunto, 10 membros contra 5 da Frelimo, uma espécie de batota. Mas o problema de fundo não está na maioria ou minoria numérica quando se sabe que não é na CNE que se ganham eleições. Beira e Quelimane estão nas mãos da oposição sem nenhuma paridade!

Em primeiro lugar, o argumento da paridade é usado com certas interpretações sem indicar concretamente a que se refere. Uma tal postulação, deixando de fora a questão numérica, é uma chacota directa à doutrina fundamental da democracia, nomeadamente à doutrina da proporcionalidade, que os ditadores que se passaram para o lado dos democratas reconhecem quando falam, mas esquecem quando agem. A defesa de um princípio sem pernas para andar só mostra que eles não estão interessados na democracia e, parece muitos seguirem cegamente. Não está no interesse da Renamo lutar pela democracia muito menos pela fortificação dos partidos da oposição. Existem, no país, mais de meia centena de partidos políticos legalmente instituídos e várias organizações da sociedade civil cujos interesses estarão fortemente ameaçados caso o princípio da Paridade seja adoptado.

A História da democracia moçambicana ensina que nenhum processo eleitoral foi democraticamente aceite pela perdiz que hoje destrói aquilo para que jura ter lutado durante a longa noite dos 16 anos, na sua violenta e insana resistência durante a qual não hesitou em recorrer a qualquer acção, tal como nos demonstrou na história recente do Moxungue. A Renamo, cujos interesses são agora defendidos pelos seguidores da oposição que esperam colher espólios da desordem e abraçam a causa da paridade, conquistou o seu reconhecimento à custa de uma série de revoltas e sangue que deram ao povo muito sofrimento ainda não totalmente esquecido. Nos seus panfletos, na resolução dos seus congressos e nos seus discursos de propaganda, já explicou ao povo, milhares e milhões de vezes, a natureza da sua luta. Assim, a actual defesa da paridade sob a forma de chantagem contra o Governo visa forçar este a comprar a estabilidade. Por outras palavras, se o Governo for intransigente, ela, fazendo uso da sua reserva militar, ataca e mata civis, divide o país, condiciona a circulação esperando que o Governo compre a estabilidade, custe o que custar. Quem defende esta forma de fazer política trai os alicerces da democracia e deita abaixo os pilares da construção do Estado de Direito a favor do qual todos somos chamados a defender. Os actuais gritos e lamentos contra o regime sob a forma de clamores a favor do Estado Democrático, são uma chacota à Democracia e representam, na realidade, uma merecida passagem para o lado dos ditadores e a negação, ao Estado, do direito à sua própria revolução. São uma defesa do reformismo partidário, no preciso momento em que este reformismo está em colapso.

Em segundo lugar, todos os defensores que explicam a natureza da paridade estão a expressar a ideia que eles próprios expressaram com maior exactidão quando disseram que a CNE estava partidarizada. Não há um único democrata nem um único lúcido sincero entre aqueles que agora clamam contra a CNE que reconhece esta verdade fundamental da democracia: a Frelimo teve uma maioria absoluta e possui a legitimidade para aprovar leis para acções presentes e futuras e defender acções passadas. E agora, quando ela começa a agir e movimentar-se para a destruição desta maquinaria da partidarização da CNE apostando no maior envolvimento da Sociedade Civil, alguns colocam a situação como se a Renamo estivesse a dar aos moçambicanos a democracia pura, como se a Frelimo estivesse a abandonar a resistência e pronta a submeter-se à minoria parlamentar, como se numa república democrática não existisse causas a defender.

Os democratas sinceros sabem muito bem que a expressão Paridade da CNE, mesmo na mais democrática das repúblicas burguesas, é uma frase vazia de sentido. A Renamo chamou paridade o direito dela estar em igual posição em relação à Frelimo, partido de quem recebeu tetra-derrotas. A Renamo chamou Paridade o direito de os partidos políticos dividirem entre si as riquezas do país. Quando fala da distribuição da riqueza não o faz em prol do povo mas olha para o seu umbigo. Com que legitimidade ela a Frelimo devem dividir entre si as riquezas de todos os moçambicanos? A paridade na riqueza nacional é subversão das coisas. A Renamo pretende moldar a chamada opinião pública para se apoderar, por via de força, do poder e da riqueza. O primeiro passo foi apagar da cena política o MDM para, de seguida, virar as baterias contra o arqui-adversário de sempre. E os acontecimentos revelam-nos que os defensores da democracia pura são, na verdade, os defensores do sistema mais sujo e corrupto de domínio dos partidos políticos sobre os meios de democratização das massas.
Enganam o povo com frases agradáveis, sonantes e bonitas mas totalmente falsas, tentando dissuadir as massas da tarefa histórica concreta de libertar a CNE dos partidos políticos que assumiram o seu controlo. A verdadeira CNE apenas existirá na ordem estabelecida pela Sociedade Civil, na qual será impossível ser árbitro da própria causa, onde será impossível sujeitar directa ou indirectamente os seu membros ao poder da influência, onde não haverá obstáculos que impeçam nenhum partido de usufruir e até concretizar o direito igual ao uso da CNE para ganhar eleições. O resto, são manobras dilatórias de quem jurou não ir às eleições e tudo fazer para que os outros também não o façam. Devemos, como um povo, rejeitar a resistência violenta de uma força política em vias de perder o seu domínio político. Segue-se, pois, que a paridade é um princípio de grandeza moral coberta de aço mas com pernas de barro. A qualquer humidade vai derreter e não conseguirá andar.