sábado, 28 de fevereiro de 2015

Carta ao Ministro da Educação

Local: Izmir, Turquia

Assunto: Cobranças ilícitas para vagas na Educação

Excelência! Deve ser a primeira vez que escrevo uma carta a um Ministro. Sou docente na maior Instituição Universitária de Moçambique, ou, se quiserem, Universidade Pedagógica de Moçambique,  actualmente na Turquia, a fazer Doutoramento. Além da UP, fui professor no ensino primário, no secundário, na Saúde e na Academia Militar, pelo que escrevo esta carta consciente de que o problema que apresento mereça um olhar a vosso nível. Excelência, tinha dois educandos no Instituto de Formação de Professores de Tete, uma prima e um primo, de cujas dispersas pagava, com gosto, esperançoso de que, uma vez terminada a sua formação, juntos pudéssemos lutar para combater a pobreza. Concluíram com sucesso e com boas notas. O que me espantou, primeiro, foi a prima que pediu algum valor para poder «garantir o lugar», a nova linguagem que se usa para colocação. Não dei, confiante de que a meritocracia tinha inaugurado o seu reinado e que a continuidade escondia dentro de si a mudança. 

Nas últimas semanas, enquanto esperava pela colocação dela, foi a vez do primo que pediu para eu «interceder». Excelência, pode imaginar o que é viver no antigo Império Bizantino e resolver problemas nos antigos apêndices do Império do Muenemutapa!  Indiquei a pessoa a quem o primo devia falar, algures em Moatize, desde que falasse do meu nome, tal uso de influência em voga na nossa sociedade, um mal que deve ser combatido. Dias depois, o meu primo já era uma pessoa feliz com guia para ir a um distrito. Apesar de o referido distrito possuir défice de professores, os responsáveis pelos recursos humanos estão a exigir entre 6.000 a 15.000 Meticais por pessoa, só para ter colocação. E os que tinham sido fracos durante a formação, mas com dinheiro, já estão a trabalhar enquanto os melhores sem dinheiro, mas que poderiam ajudar na melhoria da qualidade do ensino, continuam a viver as incertezas. No caso do  meu primo, eu devo interceder também ao nível distrital, mas…. Perante os factos, não imagino quantos moçambicanos podem estar a ser vítimas desta actuação, muitos deles contando com as próprias forças, sem alguém que possa interceder por eles.

Atenciosamente

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Carta a um amigo frelimista: o nosso céu em perigo

Meu caro plebeu

Quando, nos saudosos dias de vida religiosa, éramos assíduos frequentadores das missas dominicais, mal diríamos então que, passados 17 anos nos tornaríamos a encontrar nesta longa caminhada da vida, numa terra longínqua como Turquia. O amigo, coberto de glória, pelos seus triunfos sucessivos que o tornaram um empresário moderado, que encanta seguir, eu gasto e cansado pela longa permanência fora do país. Naquele tempo, sempre saudoso, para reforçar a modesta compreensão linguística, lancei mão, com parca habilidade, de crónicas que escrevia para uma revista religiosa da Companhia de Jesus. Assim me ficou o hábito de escrever, nunca perdido pela temporada na Europa, de onde te mandei cartas sobre as nossas relações de longa data e, em especial, sobre os nossos valores religiosos. É baseando-me nestes valores que analiso a actual realidade nacional. Quando os frelimistas tratam de situação particularmente muito grave, costumam escrever no cabeçalho das suas directivas as palavras «Unidade, Trabalho e Vigilância». Ter alguma palavra ou expressão de esperança é uma prática sensata que conduz à clareza do pensamento. Meu caro, estejamos vigilantes porque as constatações do passado mês de Novembro, acerca de regiões autónomas, passados já três meses, não perderam a sua actualidade, pelo contrário, parecem urgir-nos ainda mais. Uma nuvem negra cobre o céu da Frelimo! Naquele dia - ainda me lembro - dizias que as duas oposições tinham agendas e visões diferentes mas iguais na concepção. Se para a Renamo a justiça seria possível na divisão do país, para o MDM ela encontrava a sua materialização na tribalização da política. A Frelimo, pelo contrário, acredita que a justiça deve ser encontrada na Unidade Nacional. E concluías dizendo que a ideia da unidade é a mais valiosa pelo que deve ser defendida. Concordei contigo em tudo e ainda concordo. 

Entretanto, devo dizer-te, pois, algumas coisas preocupantes. O que está a acontecer é que as intenções da Renamo são demasiado incertas e falta-lhes a clareza necessária para que possamos nos pronunciar sobre elas. A última e tremenda guerra da qual acabámos de sair, além do seu elevado custo enquanto durou, dinheiro que poderia ser investido em outras áreas sociais, aumentou a miséria e a penúria, principalmente nas áreas afectadas, afastou investidores criando incertezas. Preparou um terreno fertilíssimo para os factores de divisão e veio dar mais força aos que a financiam e habitualmente a fomentam. A guerra sempre recuou os nossos ideais. Dos esforços e dos trabalhos dos guerrilheiros da Renamo só hoje restam ruínas, nada mais do que ruínas e miséria, medo e desespero. Por mais paradoxal, porém, que pareça, é disso que a Renamo se serve e se orgulha, lançando culpas a quem governa, mesmo quando ela é responsável que intimida investidores. Vemos, por uma parte, o homem comum voltar-se para essas doutrinas de autonomia como para um Evangelho, que traz a promessa de uma vida melhor depois da morte. Esta mesma Renamo, nos anos 90, recusou-se a nomear Governadores e administradores nas áreas em que tinha vencido. Esta ideia já era originalmente da Frelimo e eles a recusaram alegando que queriam governar todo o país. Com o passar da idade, há que tudo fazer para ser presidente de alguma coisa, o que é bom! Aconteceu durante a Luta Armada de Libertação Nacional. Porém, o boicote das eleições municipais pela Renamo em 1998 e em 2013 afastou-a da conquista dos espaços onde pudesse exercer o agora tão almejado poder autónomo e seu lugar foi ocupado pelo MDM, hoje em apuros. Por outro lado, intelectuais, intimados por uma espécie de fatalismo, ou fecham voluntariamente os olhos ao perigo imediato ou capitulam de antemão, preparando-se para um martírio inevitável. E nos aconselham a tratar Dhlakama como ovo, dando-lhe toda a razão do país porque, segundo dizem, pode ficar zangado e complicar as coisas. Acrescentam dizendo que assim o fazem para o bem da própria Frelimo. Entretanto, o perigo mais grave é que, ultimamente, de vários segmentos da sociedade, a juventude desempregada tem sido facilmente seduzida. 

Ao ver as flagrantes injustiças e abusos da ordem social nos quais poucos comem e muitos se sufocam com o cheiro dos restos de boa comida, ao ver o sonho de ter emprego estar cada vez mais reservado para quem já tem algum dinheiro devido à venda de vagas e ao uso de influência feita pelos sectores dos Recursos Humanos nas instituições públicas e que as forças da posição parecem não poderem ou não quererem enfrentar a situação de frente, dão ouvidos às novas doutrinas. E isto faz com que se diga de boca cheia que a proposta de lei a ser submetida para Assembleia da República seja tratada de forma especial sob risco de «este Governo cair». Meu caro plebeu, vemos o Parlamento a perder a sua vitalidade. Já é difícil afirmar que o poder pertence ao povo quando o Parlamento que o representa não é livre de debater e de decidir de forma consciente e quando a maioria parlamentar é ameaçada pela minoria. Ademais, a teoria da autonomia não é uma suposição abstracta porque os seus ideólogos a ensinam, agem e vivem. É de grande importância que os frelimistas a conheçam, tal qual é na verdade. Este é o nosso dever mais difícil e urgente nos dias que correm. Dever mais urgente, pois o objectivo imediato, visado pelos nossos irmãos, não é apenas divulgar a própria doutrina, mas pôr em confronto directo entre o Presidente Nyusi e a Frelimo; apossarem-se do poder, para, com seus métodos já conhecidos, poderem cortar à Frelimo qualquer acesso ao povo. Estamos perante uma violação dos destinos nacionais e tal está a acontecer debaixo de um véu de frases moralizadoras, talvez destinadas a apaziguar a sua consciência dos seus autores, de quem seria de esperar palavras de condenação. 

É preciso cortar os tentáculos empolgantes da Renamo, que se estendem sem cessar aos lares dos pobres para saciar as suas bocas sugadoras, com falsas promessas. Ela sonha em criar um cinturão de resistência silenciosa que nos poderá pesar no futuro. Como frelimistas, amigo, temos que ir-nos prevenindo das manobras suspeitas da Renamo. Abraçados por uma mão de confiança cega e calados poderemos acordar assustados, despejados do poder porque sem acesso ao povo. Assim como no passado o anti-socialismo, assim agora o anti-constitucionalismo pôde nascer e robustecer-se devido às condições de vida da grande massa populacional, tão duras, ou antes insuportáveis, que reinavam e ainda reinam. O que devemos aconselhar que se faça e em que devemos ajudar, é, sem mais nem menos, um plano de salvação nacional que dará melhores condições de vida ao povo. Em que, então, o rápido desenvolvimento e, provavelmente crescimento económico deverá ajudar a cada um dos moçambicanos? É, nem mais nem menos, a segurança alimentar, a assistência social, a liberdade e o progresso para todos os lares e famílias, para todos os homens e mulheres de todo o país. E aqui, refiro-me, em particular, à miríade de casas e pequenas cabanas nas quais os chefes de família lutam, no meio de todos os acidentes e dificuldades da vida, para proteger a mulher e os filhos das privações e educar a família segundo conceitos éticos que frequentemente desempenham um papel fundamental em suas vidas. Não há nada mais típico dos que têm medo do diálogo do que repetirem e voltarem a repetir um argumento que já foi perfeitamente rebatido e refutado, com o objectivo de construir uma opinião pública através da propaganda junto dos seus simpatizantes. Não tenho palavras para exprimir a força da minha convicção de que, para continuarmos a ter democracia, é nossa obrigação promover a protecção do Parlamento e a independência dos deputados! Adeus amigo, voltarei a escrever-te!

Do teu amigo, deste lado da Ásia Menor, Unidade, Trabalho e Vigilância.


Os tentáculos empolgantes da Renamo, um perigo no céu da Frelimo

Meu caro plebeu

Quando, nos saudosos dias de vida religiosa, éramos assíduos frequentadores das missas dominicais, mal diríamos então que, passados 17 anos nos tornaríamos a encontrar nesta longa caminhada da vida, numa terra longínqua como Turquia. O amigo, coberto de glória, pelos seus triunfos sucessivos que o tornaram um empresário moderado, que encanta seguir, eu gasto e cansado pela longa permanência fora do país. Naquele tempo, sempre saudoso, para reforçar a modesta compreensão linguística, lancei mão, com parca habilidade, de crónicas que escrevia para uma revista religiosa da Companhia de Jesus. Assim me ficou o hábito de escrever, nunca perdido pela temporada na Europa, de onde te mandei cartas sobre as nossas relações de longa data e, em especial, sobre os nossos valores religiosos. É baseando-me nestes valores que analiso a actual realidade nacional. Quando os frelimistas tratam de situação particularmente muito grave, costuma escrever no cabeçalho das suas directivas as palavras «Unidade, Trabalho e Vigilância». Ter alguma palavra ou expressão de esperança é uma prática sensata que conduz à clareza do pensamento. Meu caro, estejamos vigilantes porque as constatações do passado mês de Novembro, acerca de regiões autónomas, passados já três meses, não perderam a sua actualidade, pelo contrário, parecem urgir-nos ainda mais. Uma nuvem negra cobre o céu da Frelimo! Naquele dia - ainda me lembro - dizias que as duas oposições tinham agendas e visões diferentes mas iguais na concepção. Se para a Renamo a justiça seria possível na divisão do país, para o MDM ela encontrava a sua materialização na tribalização da política. A Frelimo, pelo contrário, acredita que a justiça deve ser encontrada na Unidade Nacional. E concluías dizendo que a ideia da unidade é a mais valiosa pelo que deve ser defendida. Concordei contigo em tudo e ainda concordo. 

Entretanto, devo dizer-te, pois, algumas coisas preocupantes. O que está a acontecer é que as intenções da Renamo são demasiado incertas e falta-lhes a clareza necessária para que possamos nos pronunciar sobre elas. A última e tremenda guerra da qual acabámos de sair, além do seu elevado custo enquanto durou, dinheiro que poderia ser investido em outras áreas sociais, aumentou a miséria e a penúria, principalmente nas áreas afectadas, afastou investidores criando incertezas. Preparou um terreno fertilíssimo para os factores de divisão e veio dar mais força aos que a financiam e habitualmente a fomentam. A guerra sempre recuou os nossos ideais. Dos esforços e dos trabalhos dos guerrilheiros da Renamo só hoje restam ruínas, nada mais do que ruínas e miséria, medo e desespero. Por mais paradoxal, porém, que pareça, é disso que a Renamo se serve e se orgulha, lançando culpas a quem governa, mesmo quando ela é responsável que intimida investidores. Vemos, por uma parte, o homem comum voltar-se para essas doutrinas de autonomia como para um Evangelho, que traz a promessa de uma vida melhor depois da morte. Esta mesma Renamo, nos anos 90, recusou nomear Governadores e administradores nas áreas que tinha vencido. Esta ideia já era originalmente da Frelimo e eles a recusaram alegando que queriam governar todo o país. Com o passar da idade, há que tudo fazer para ser presidente de alguma coisa, o que é bom! Porém, o boicote das eleições municipais pela Renamo em 1998 e em 2013 afastou-a da conquista dos espaços onde pudesse exercer o agora tão almejado poder autónomo com o seu lugar ocupado pelo MDM, hoje em apulos. Por outro lado, intelectuais, intimados por uma espécie de fatalismo, ou fecham voluntariamente os olhos ao perigo imediato ou capitulam de antemão, preparando-se para um martírio inevitável. E nos aconselham a tratar Dhlakama como ovo, dando-lhe toda a razão do país porque, segundo dizem, pode ficar zangado e complicar as coisas. Acrescentam dizendo que assim o fazem para o bem da própria Frelimo. Entretanto, o perigo mais grave é que, ultimamente, de vários segmentos da sociedade, a juventude desempregada tem sido facilmente seduzida. 

Ao ver as flagrantes injustiças e abusos da ordem social nos quais poucos comem e muitos se sufocam com o cheiro dos restos de boa comida, ao ver o sonho de ter emprego estar cada vez mais reservado para quem já tem algum dinheiro devido à venda de vagas e ao uso de influência feita pelos sectores dos Recursos Humanos nas instituições públicas e que as forças da posição parecem não poderem ou não quererem enfrentar a situação de frente, dão ouvidos às novas doutrinas. E isto faz com que se diga de boca cheia que a proposta de lei a ser submetida para Assembleia da República seja tratada de forma especial sob risco de «este Governo cair». Meu caro plebeu, vemos o Parlamento a perder a sua vitalidade. Já é difícil afirmar que o poder pertence ao povo quando o Parlamento que o representa não é livre de debater e de decidir de forma consciente e quando a maioria parlamentar é ameaçada pela minoria. Ademais, a teoria da divisão do país não é uma suposição abstracta porque os seus ideólogos a ensinam, agem e vivem. É de grande importância que os frelimistas a conheçam, tal qual é na verdade. Este é o nosso dever mais difícil e urgente nos dias que correm. Dever mais urgente, pois o objectivo imediato, visado pelos nossos irmãos, não é apenas divulgar a própria doutrina, mas pôr em confronto directo entre o Presidente Nyusi e a Frelimo; apossarem-se do poder, para, com seus métodos já conhecidos, poderem cortar à Frelimo qualquer acesso ao povo. Estamos perante uma violação dos destinos nacionais e tal está a acontecer debaixo de um véu de frases moralizadoras provenientes de pessoas em quem seria de esperar palavras de condenação, talvez destinadas a apaziguar a consciência.

É preciso cortar os tentáculos empolgantes da Renamo, que se estendem sem cessar aos lares dos pobres para saciar as suas bocas sugadoras, com falsas promessas. Ela sonha em criar um cinturão de resistência silenciosa que nos poderá pesar no futuro. Como frelimistas, amigo, temos que ir-nos prevenindo das manobras suspeitas da Renamo. Abraçados por uma mão de confiança cega e calados poderemos acordar assustados, despejados do poder porque sem acesso ao povo. Assim como no passado o anti-socialismo, assim agora o anti-constitucionalismo pôde nascer e robustecer-se devido às condições de vida da grande massa populacional, tão duras, ou antes insuportáveis, que reinavam e ainda reinam. O que devemos aconselhar que se faça e em que devemos ajudar, é, sem mais nem menos, um plano de salvação nacional que dará melhores condições de vida ao povo. Em que, então, o rápido desenvolvimento e, provavelmente crescimento económico deverá ajudar a cada um dos moçambicanos? É, nem mais nem menos, a segurança alimentar, a assistência social, a liberdade e o progresso para todos os lares e famílias, para todos os homens e mulheres de todo o país. E aqui, refiro-me, em particular, à miríade de casas e pequenas cabanas nas quais os chefes de família lutam, no meio de todos os acidentes e dificuldades da vida, para proteger a mulher e os filhos das privações e educar a família segundo conceitos éticos que frequentemente desempenham um papel fundamental em suas vidas.

Do teu amigo, deste lado da Ásia Menor, Unidade, Trabalho e Vigilância.


sábado, 7 de fevereiro de 2015

Salvar Dhlakama para Salvar o País

Afonso Dhlakama,  político que em Janeiro jurou não ajoelhar-se, em menos de 72 horas correu para Maputo a convite do Presidente Filipe Nyusi, o primeiro a antecipar-se ao local do encontro. Ambos, ao que tudo indica, carregam bases sólidas para dar forma a uma nova realidade política e garantir a paz. Enquanto isso, os adeptos fervorosos da divisão, angustiados, amargurados e inconsoláveis, recebiam a decisão do líder da Renamo com surpresa e até estupefacção. Ninguém conceberia nunca que Dhlakama, que jurou governar em honra da alma da mãe, fosse deslocar-se a Maputo interrompendo o seu périplo propagandístico. E porque terá feito isso, decepcionando os teóricos da divisão? A resposta é simples. A Renamo estava em via de dividir-se devido aos rumores de que os deputados proibidos de tomar posse iam fazê-lo a conta e risco próprios. Daqui resulta que o beneficiário deste encontro é o próprio Dhlakama ao parecer-se como alguém que negociou a tomada de posse daqueles cuja decisão para o efeito já estava tomada. Nyusi salvou Dhlakama, do precipício, no seu primeiro gesto público de dimensão nacional. Em todo o caso, mais do que isso, devemos aproveitar a oportunidade para, como disse no passado distante, conseguirmos uma paz duradoura baseada na justiça. Com toda a sinceridade, Filipe Nyusi acolheu Dhlakama com total protecção e segurança sendo o encontro de Fevereiro, só por si, um tremendo ponto de viragem, uma mudança decisiva. É um gesto humilde, honroso porque como alguém disse, é preciso acarinhar Dhlakama. Uma vez salvo, estaremos preparados para salvar o país, de uma previsível instabilidade.

Nós, do outro lado da barricada, congraturamo-nos com este encontro que desilude aos apóstolos do caos porque dele esperamos ver continuada a determinação unida e inflexível dos dois em prosseguir o caminho da inclusão até à sua conclusão vitoriosa. Há os que insinuam que a consciência de Dhlakama foi comprada, algo em que acreditamos, em virtude das vantagens palpáveis  que Dhlakama colheu. Visitou a família, matou saudades da família, evitou a rotura previsível do partido e enfraqueceu ainda mais o seu adversário interno, o MDM. Conseguir vantagens desta escala e complexidade num único acto é, por si só, um grande empreendimento. No entanto, encontramo-nos na fase preliminar de uma das maiores batalhas políticas do nosso tempo – a batalha por um Moçambique inclusivo, justo e desenvolvido. Filipe Nyusi está a combater em muitos outros pontos, para conciliar as forças progressistas e conservadoras da Frelimo e tem que estar preparado para contrariar aqueles que tudo farão para desacreditá-lo ou mesmo para fracassar nos seus nobres ideais. Peço licença para citar as palavras dele segundo as quais «boas ideias não têm partido». Tendo em conta a gravidade do momento, penso que os conservadores o perdoarão pela falta de cerimónia com que foi necessário agir.

Deixai-me dizer uma palavra ao líder da Renamo. Uns dizem que «no passado também foi assim e continuamos tendo pessoas perseguidas pela sua simpatia para com a Renamo». Outros dizem ainda que «para ser alguém, para conseguires emprego ou promoção/progressão tens que ser do Partido no Poder. Se não te descobrem no momento do recrutamento, ao longo do trabalho tens que te revelar frelimista através das reuniões nas células». Sim, tínhamos as nossas razões e os nossos receios. Mas o tempo chegou em que a competência será determinante para o sucesso dos funcionários públicos. Sim, recusamos encontrar-nos convosco, onde quer que fosse. Estivemos juntos em festas, em reuniões e em encontros nacionais e internacionais e os nossos membros não trocaram, como ainda outros não trocam, cumprimentos com os vossos. Sim, isto aconteceu e continua a acontecer. É também verdade que sempre impusemos, como pré-condição para quaisquer negociações convosco, a presença de um mediador que se avistasse separadamente com cada uma das partes. Sim. Foi através deste procedimento que tiveram lugar o primeiro e o segundo acordos de interrupção das hostilidades. Os representantes do Governo reuniram-se em Gaberone e em Nairobi sem terem trocado directamente uma palavra. Sim, isto aconteceu. 


Mas hoje, o Presidente Nyusi deu-vos sinal de que quer contar convosco na construção de um Estado fundado numa paz permanente baseada na honestidade das intenções. Ele enfrentou a realidade com coragem consciente de que nunca se encontrará a solução para um problema fugindo-lhe ou ignorando-o. Enfrentou-a consciente de que a paz que está no seu manifesto não pode durar se se tentarem impor conceitos fantasiosos aos quais grande parte dos moçambicanos viraram as costas, anunciando o seu apelo unânime ao respeito pela Unidade Nacional. Aqui tivemos um bom começo, como testemunharam os vossos sorrisos. Quanto a nós, acreditamos não ser necessário entrarmos num círculo vicioso em relação aos direitos dos renamistas se revoltarem contra todas as formas de exclusão baseada na filiação política, uma realidade presente no nosso país que, tal como foi com o colonialismo, ou como acontece com as várias epidemias e catástrofes, deve ser erradicada. Não queremos moçambicanos estratificados porque discriminados no acesso aos recursos que a todos pertencem, o que incentiva o ódio dos que não têm contra os que têm. É inútil criar obstáculos, de contrário, impedir-se-á o caminho para a paz ou a paz será destruída. Como vos disse, num passado imemorial, não se pode basear a felicidade na desgraça dos outros. Com o encontro de hoje, não se deve recear dialogar com Nyusi que necessita do vosso auxílio para desenvolver o país.