quarta-feira, 11 de junho de 2014

Juntos pelo templo da paz

Antes de escrever este texto, orei a Deus Todo-Poderoso com cada batida do meu coração e com todo o sentimento. Durante as minhas orações, pedi ao Todo-Poderosos que me desse forças - para suportar a mensagem que acabava de receber segundo a qual uma família de quatro membros que me acolhera no passado mês de Janeiro acabava de sucumbir, algures em Vanduzi, debaixo do fogo cruzado quando tentava ir a Gorongosa – e confirmasse a minha convicção de que este texto pode atingir o objectivo por que anseio, o de um presente feliz e um futuro ainda mais risonho. Precisamos de construir um templo da paz. Tenho uma grande admiração e consideração pelo Governo de Moçambique. Existe uma profunda simpatia e boa vontade para com a Renamo e a firme determinação de continuar, apesar das muitas divergências e obstáculos, a tentar estabelecer as pontes do diálogo. Congratulamo-nos ou deveríamos congratular-nos com contactos constantes, frequentes e crescentes nesse sentido. Na imprensa de hoje, há uma tendência de diabolizar uns inocentando outros, conforme a paixão política do interveniente o que leva ao extremar de posições. Todavia, é meu dever – e tenho a certeza de que vos desagradaria que eu não apresentasse os factos tal como os vejo -, dizia; é meu dever confrontar-vos com determinados factos acerca da presente situação.

A situação no Save em em Moxungue continua tensa, com os motoristas a condicionarem a circulação dificultando o trabalho das forças armadas. A Renamo está agora a tentar, agindo unilateralmente, construir aquilo a que eu chamaria a esfera renamista e todas as aldeias na Grande Gorongosa, em Chibabava e em Maringue estão sujeitas, de uma ou outra forma, não só à influência renamista, mas também a um controlo extremamente apertado, e em certos casos, crescente, por parte da Renamo. A partir de Gorongosa está a alastrar o comportamento policial. Somente a vila da Gorongosa, com as suas glórias imortais, está livre de ataques. Os homens da Renamo foram encorajados pelo seu líder a apoderarem-se ilegalmente de partes importantes do território florestal, e estão a ter lugar expulsões em massa de centenas de camponeses gorongosenses, maringuenses, chibabavenses, numa escala atroz e inimaginável. A sua produção agrícola é apoderada pelos homens armados da Renamo. Uma sombra desceu sobre o cenário tão recentemente iluminado pelo cessar-fogo que durava há vinte dias. Ninguém sabe o que a Renamo pretende fazer num futuro imediato, nem quais serão os limites, se é que existem, das suas tendências expansionistas. A situação presente deve forçar-nos a agir em prol das paredes da paz, uma acção que deve ser levada por todos os segmentos sociais iluminados: académicos, igrejas, sociedade civil e partidos políticos. Em nada nos ajuda diabolizar a Renamo ou o Governo perante a situação presente porque, como disse no passado, juntos podemos vencer o mais perigoso dos assaltos da história moderna, a batalha por uma paz permanente baseada na justiça.


Falei atrás, caros compatriotas, no templo da paz. Este templo tem de ser construído pelos moçambicanos de todas as cores. Todos devemos acreditar no propósito do outro e termos esperança no futuro do outro e compreensão para com as limitações do outro, para citar algumas belas palavras que aqui li há uns dias, «porque não poderemos trabalhar juntos numa obra comum, como amigos e associados?» Temos de partilhar as ferramentas da paz, aumentando a capacidade da diminuição das ferramentas da guerra. Talvez os exemplos do que já experimentamos ou retirámos da História antiga ou moderna nos ensinem que os blindados, os tanques de guerra e as armas por si só não podem garantir a segurança e a paz. Em vez disso, destroem o que a segurança e a paz construíram. As instituições universitárias devem organizar debates para apontar os caminhos para a paz. As igrejas devem organizar as vigílias para amolecer os espíritos duros que teimam em levar o país ao colapso moral. As organizações da sociedade civil devem organizar manifestações diversas em prol da paz. Os partidos políticos devem procurar mais aquilo que os une. Todos cabemos neste Moçambique, porque «na casa do meu Pai há muitas moradas». Na verdade, é isto mesmo que temos de fazer, senão o templo da paz pode não chegar a ser construído, ou, tendo-o sido, desmoronar-se-á, e nós revelar-nos-emos novamente impossíveis de ensinar e teremos de voltar, pela terceira vez, a tentar aprender na escola da guerra, agora incomparavelmente mais rigorosa do que aquela cujas consequências estamos a sentir.

A Idade das Trevas e a Idade da Pedra podem regressar nas asas cintilantes da nação, e os recursos naturais ora descobertos que poderiam agora fazer literalmente chover incomensuráveis vantagens materiais sobre todos nós podem provocar a nossa total destruição. Cuidado, digo-vos eu, o tempo é muito curto. Não optemos por deixar correr os acontecimentos até ser tarde de mais. Evitemos ridicularizar uma das partes em conflito para diminuir a animosidade. Uma contenção na linguagem. Este é o caminho da sabedoria! Mais vale prevenir do que remediar. Temos de, em todo o lado, defender o homem da subjugação pela força das armas para que possamos dotar todos os moçambicanos do poder dos valores e princípios que promovem a sublime condição da moçambicanidade. Não podemos alimentar fanatismos, pelo contrário, canalizemos todos os nossos esforços para a construção de uma grande fortaleza de paz, em vez de fabricarmos inimigos imaginários. Esta batalha não é só do Governo, nem é apenas a batalha da Renamo. É a batalha de cada um dos cidadãos cujo direito é viver em paz. É um compromisso de consciência e responsabilidade nos corações de milhões de moçambicanos. É isto que vinha dizer. A mensagem está entregue, Deus é minha testemunha.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Duas incógnitas

Diz-se que se o MDM ganhar a ponta vermelha irá desnacionalizar tudo o que a Frelimo nacionalizou. As casas irão para os antigos colonos. A minha primeira incógnita é que não sei o que sucederá com os hospitais e os edifícios escolares que, mercê da nacionalização, permitem ao muçulmano, quanto ao ateu e ao próprio cristão fazerem uso deles sem formalidades nenhuns. Não foi por acaso que Lisboa, mais do que   outra capital europeia, tornou-se no verdadeiro salão de jantares do Daviz Simango, o líder do galo. Chamar emoções para ganhar dividendos políticos é o que se deve aconselhar que homens de bem não se metam.  Um alto espírito da nossa terra, referindo-se à origem do MDM, num artigo inserto há tempos num grande semanário de Maputo, o Domingo, designou por «criação dos tugas» e que os Simango são apenas a face moçambicana do movimento. Não me furto de citar um outro espírito local que referindo-se aos passeios dos líderes do Galo em Portugal disse: «… os encontros não tinham como participantes os moçambicanos por lá radicados, mas sim os ex-colonos e o manifesto foi a promessa de devolução dos imóveis por estes deixados aquando da independência de Moçambique, o que valeu inúmeros apoios ideológicos e monetários, algo que similarmente aconteceu nos outros países, porém, ai com promessa de partilha dos recursos naturais de Moçambique».

Nesse artigo, o seu ilustre autor, mostra-se em desacordo com a propaganda do MDM para angariar fundos com promessas absurdas, e também nós, dentro do modesto valor da nossa opinião, a consideramos, por virtude até de moralidade que promove, se não inconveniente, pelo menos, pouco aconselhável traze-la a público na hora actual em que as feridas da colonização ainda sangram. «Aguas passada», como esclarecidamente observa o artigo a que nos referimos, «não movem moinhos». Com efeito, é evidente que hoje não se pode falar de devolver as casas nacionalizadas aos ex-colonos. Muitas delas já não estão em condições e já foram alienadas. A nossa política não pode ser condicionada pelas atitudes gravosas que outras nações tiveram para connosco em épocas já agora remotas. Para nos nortearmos na escolha do rumo a seguir não precisamos negociar a venda do país porque, só as realidades da hora presente e as perspectivas mais lógicas do futuro são de ponderar e ter em conta. Ninguém deseja, no seu justo estado de razão, regressar ao colonialismo. Há outras compensações que poderiam ser equacionadas para com os ex-proprietários das vivendas cuja propriedade é inquestionável. E isto, a própria Frelimo poderia ter em conta nas suas discussões. É preciso frisar que o povo moçambicano não foi vítima dos portugueses, proprietários de muitas propriedades no solo pátrio, mas do regime colonial enquanto sistema de dominação. Por isso, não nos podemos colocar no lugar de vítima, para justificar o fracasso na tomada de posição em relação ao que foi nacionalizado, fruto do suor de muitos humanos cujo erro foi suar numa terra longínqua.

A segunda incógnita é o que o MDM pensa sobre a Educação. Não concordando com o actual modelo promovido pela Frelimo que permitiu tornar muitos moçambicanos em cidadãos através da educação para todos, este partido diz que irá entregar parte das responsabilidades aos bancos privados, de modo a financiarem os estudos dos particulares. Ora, sabido que a banca moçambicana tem das mais elevadas taxas de juro no mundo, como tal será possível? As nossas universidades estão cheias de pessoas acima dos 35 anos, pelo que os bancos dificilmente poderão conceder créditos para essa finalidade. Mais uma vez, o MDM navega em pântanos, importando modelos desajustados com a realidade. Acima da afeição ou desafeição que acaso nos inspirem outros povos, e, por isso mesmo, muito acima das questões sentimentais suscitadas pelo desejo de «bem governar», aliás, de apaixonarem e dividirem os homens pacíficos, deveremos colocar sempre o interesse nacional baseado na realidade local. A própria desorientação absoluta em que vive o MDM, a respeito do dia de amanhã, recomenda que Moçambique e os moçambicanos imponham a si mesmos uma descrição de que, por certo, não poderá advir-lhes mal, nem terão que arrepender-se pelo que até aqui já foi feito em matéria da educação. Tem-se visto que pessoas preparadas dentro deste sistema de ensino questionam com argumentos sólidos a qualidade de ensino em que se formaram. Caso para perguntar, de onde vêm as suas sábias interpretações da má qualidade do ensino se elas reconhecem-se bem formadas? Este não é problema do regime, mas da sociedade como um todo.
A propósito, e como ponto final nestas considerações, diremos ainda que continua a parecer-nos difícil sustentar-se à luz dos factos, vistos com exactidão, uma educação com qualidade quando a quantidade dos que a necessitam ultrapassa grandemente os meros desejos dos políticos «que pensam nas eleições». Há combinações secretas que mais duma vez tendem a cair sobre Moçambique e representam ameaça de desrespeito pela nossa soberania e é conveniente não se esquecer que foram, sobretudo, o servilismo cego e má cabeça que o tornou possível e lhe deu alento, a causa do nosso atraso. Não regressemos nunca ao servilismo desastroso que, por muito tempo, motivou que o nosso país fosse objecto de negociações secretas nem reincidamos nas manifestações de má cabeça que em alguns passos da História nos trouxeram amarguras e vicissitudes, e poderemos, assim, confiar em que, terminado o período eleitoral, a nossa escolha não venha a criar-nos dissabores nem arrependimentos. Disse!
Pedro, MHRIC