Dizem-nos que os médicos irão vencer. Iludimo-nos
pensando que, pela força de medidas extremas, poderíamos ensinar o governo a
cair em erro deliberado de fazer o impossível. Acredito que a maior parte dos
moçambicanos assiste com algum desconforto aos julgamentos públicos que acabam
de ecoar desde as montanhas de Mueda às planícies de Gaza e prosseguem noutras
latitudes. Muitos compatriotas começaram por terminar com a condenação antes do
julgamento, mas ninguém pode ser julgado segundo uma lei ex post facto. O
julgamento dos vencidos pelos vencedores nunca é imparcial, independentemente
de ser vestido com as vestes da lei. Pergunto-me se o aumento salarial daqueles
que mal prestavam serviço, apesar de possuírem meios modernos, porque a trabalharem
nas cidades, irá encorajar um atendimento digno aos doentes à partida
condenados a todo o tipo de humilhações cuja existência o senso comum tende a
ignorar. Toda esta greve está sendo promovida por um espírito de vingança, e a
vingança raramente é sinónimo de justiça. A morte de mais pacientes constituirá
uma nódoa no cadastro moçambicano, que lamentaremos durante muito tempo. Ao
vestir a greve com as vestes do processo legal, corremos o risco de
desacreditar, por muitos anos, todo e qualquer conceito de legalidade. Em
última análise, mesmo depois de mortes terríveis havidas no passado e que
nenhum jornalista quis fazer uma investigação séria para trazer ao púbico e
consumir mas que agora voltam a carga para difundir o sucesso da greve,
deveríamos olhar para o futuro com mais esperança e até os nossos adversários
acreditassem que nós os tratámos com justiça.
Está
a ficar cada vez mais claro que a falta de vocação para um determinado serviço
é proporcional à falta de paciência e sensibilidade. Como pode ter acontecido
que a nossa gloriosa classe médica tenha esquecido do seu dever e entregue
vários dos seus juramentos ao braço alheio em troca de bens mundanos?
Será mesmo verdade que a classe médica é invencível, como gabam incessantemente
os propagandistas da oposição? É claro que não. A História mostra que não há classes
profissionais invencíveis, e nunca houve. Existe um conluio entre um pequeno
número de médicos com um pequeno número de políticos. Um conluio que a imprensa
faz de conta que não existe. Os segundos querem usar os primeiros sem que
aqueles descubram estarem na posição de para-choques. A aparição de alguns
políticos que tinham desaparecido é um sinal claro. Mas não é tudo! As
reuniões cobertas de secretismo entre alguns médicos com alguns
políticos é outro sinal. Mas ainda não é tudo! A calma numas cidades e a
violência noutros locais é algo astuciosamente pensado. Como se justifica que
em vésperas de uma greve anunciada tenha havido uma reunião entre partidos fora
do poder e os futuros grevistas, sem que tal tenha sido publicitado como exigem
as boas maneiras, mesmo pela imprensa mais próxima da oposição por isso privilegiada a ter notícias em primeira mão? Os políticos inconformados com a táctica da sua luta
encontraram nos médicos uma esperança renovada, capaz de roer aos poucos os
alicerces do governo, alicerçados no povo e dele emanados.
Os
políticos querem obrigar o governo a fazer pequenos reparos aqui e ali de
modo a propagar o veneno de pequenas greves até que o país se torne
ingovernável. E encontraram nalguns médicos, interessados em desenvolver o seu
negócio de clínicas privadas, homens corajosos, capazes de pôr o governo de
joelhos, o governo emanado do povo. É esta a associação médica que temos: a
reparar a sua imagem sem se dar conta da imagem do vizinho. Tomemos como
exemplo, a PRM. Que distância separa o salário do médico do de um polícia e
entre estes quem trabalha mais? É esta a associação médica que temos: a obrigar
o criador a renegar a criatura. Compatriotas! É certo que o nosso governo está
a ser esmagado pela força astuciosa do inimigo. Um grande perigo paira sobre o
nosso país. E, não é que encontra colaboradores internos prontos a recebê-lo com
sorriso nos lábios! Muito mais que o seu número, são os truques e a táctica que
nos faz recear o pior. Foram os truques e a táctica do passado que
surpreenderam o nosso governo a ponto de o levarem onde está hoje. Mas estará dita
a última palavra? Deverá a esperança desaparecer? Será a derrota definitiva?
Não! Acreditemos em nós
mesmos que falamos com conhecimento de causa e que dizemos que nada está
perdido. Porque o Governo não está sozinho nesta batalha! Não está sozinho! Não
está sozinho! Tem um vasto império atrás de si. Podia o Governo tomar medidas extremas que levem parte dos grevistas para o desemprego, mas não o fará pois é disso que os astutos precisam para justificarem o caos.
Pode
formar um bloco com os seus parceiros de cooperação e redesenhar as vias mais
drásticas, renegando a criatura, mas não o fará por reconhecer o povo o direito à indignação. Esta batalha não está perdida! Esta greve não
é apenas contra o governo! É uma greve de renegação do dever! É uma greve
contra o povo moçambicano. Esta greve é mais uma estratégia para forçar o povo
a estar contra o próprio governo. A este respeito, não é de somenos o facto de
alguns líderes da oposição guardarem o silêncio enquanto outros saem esporadicamente,
menosprezando os esforços conseguidos pelo Governo ao elevar o salário dos
médicos para 15%. Naturalmente, o nosso Governo amante da paz e não desejando
tomar a iniciativa de quebrar a confiança, não poderia recorrer a uma perfídia.
O Governo não traiu a ninguém! Apenas não pode dar o que não tem e nem
pode cunhar mais dinheiro para dar aos médicos sob pena de zimbabweanizar
Moçambique, com uma inflação galopante. Poderá
perguntar-se: como pode o Governo moçambicano ultrapassar este imbróglio? Terá
sido um erro ter prometido que havia de dar soluções na concertação
social, no mês de Abril? É claro que não! O Governo não disse da primeira
vez que havia de satisfazer em 100% as reivindicações dos médicos como querem dar a
entender os vendedores da esperança. Creio que nenhum governo amante
da paz poderia dizer «NÃO» a uma contraparte no momento H de
tensões, mesmo se esta contraparte fosse liderada por demónios e canibais.
Deve o Governo rescindir o contrato com os que não querem trabalhar? Por enquanto não, mas
não é de pôr de lado.
O que é necessário para pôr fim ao perigo
que paira sobre o nosso país, e que medidas devem ser tomadas para envergonhar
aqueles que estão atrás dos médicos com segundas e terceiras intenções? Acima de
tudo, é essencial que o povo compreenda toda a magnitude do perigo que ameaça o
nosso país e abandone todas as falsas espectativas criadas em volta da riqueza
que ainda não temos. Esta ideia de riqueza foi mais difundida pelos escribas da
oposição e difundidas pelos seus meios de propaganda. Se o Governo fosse rico,
não lhe custaria aumentar o salário conforme o desejo dos médicos para continuar a
usufruir do que dizem ser o resultado dos impostos do povo. O adversário do
regime é astuto, cruel e implacável a ponto de mandar fechar casas mortuárias e armazéns de comida hospitalar!
Ele apodera-se dos corações mais sensíveis com intenções de apoderar-se do
poder por vias menos legítimas, esquecendo que este Governo está dentro do prazo de validade. O povo deve erguer-se não contra os médicos,
mas contra os incitadores dos médicos, os arquitectos morais de tudo isto! Se o
povo deve estar alerta, os membros do partido no poder devem combater até à
última gota do sangue pelas causas consideradas justas. O país tem leis e em tudo
deve, para a função pública, reger-se por leis. Se me perguntassem qual era a
minha opinião em relação ao aumento salarial aos médicos, responderia que não
se lhes deve aumentar porque tal iria abrir precedentes perigosos para outras
classes profissionais. Mas porque sou apenas uma cabeça, acatarei a decisão que for tomada. Temos que fortalecer a retaguarda e nunca ceder
chantagens.
Pedro MAHRIC
Anexo
Texto de David Mauricio Bamo
“AS HIENAS TAMBÉM SORRIEM”
As Hienas Também Sorriem: Um efeito dominó para muitas “classes”
As Hienas Também Sorriem é o mais recente brinde literário do Contista e dramaturgo, representativo da novíssima prosa moçambicana, Aurélio Furdela. O livro não é feito só de contos, assim como de canções de angústia sadicamente cantadas por diversas forças vivas da sociedade.... Isto porque as fábulas da obra retratam o dia-a-dia de qualquer moçambicano, é como se de Marrabenta clássica de Moçambique se tratasse. Uma Marrabenta que exaltação das nossas vitorias e desgraças.
Por outro lado, o livro remete-nos a hipocrisia caracterizada pelo sentido metafórico do seu título, As Hienas Também Sorriem. Pois bem, como é possível? Hienas seres selvagens tão perigosas, sem humanismo possível para sorrirem, mas que na prosa “cronística” Furdeliana aventurada nos contos, vão mostrar os seus perigosos dentes.
Na nossa óptica a abordagem de Aurélio Furdela não é essencialmente uma carta de amor aos doutores deputados, porque o efeito dominó é extensivo à muitas classes. Quantas vezes não vimos gente falsa com sorriso largo, a engatar inocentes pelo cifrão, padres que estupram crianças, jornalistas que vivem de comissões, ganância assassina que leva os médicos a abandonarem os doentes, meia a volta, estas todas classes quando o assunto é a protecção do estômago faz-se de vitima, e num outro ângulo, finge um profissionalismo inexistente. E nós perguntamos quem são essas hienas que sorriem? É o que Roberto Chitsondzo chamaria de Katina P, ou seja, todos os esforços que se opõem ao desenvolvimento. Há aqui uma falsidade que mata, arrogância que mata, estupidez que mata, individualismo que mata, e esses actos macabros, quem leva a cabo? São de homens e mulheres desta terra libertada com suor, sacrifício e sangue. Não obstante, e me socorrendo na música Sathani dos “Bons Rapazes”, tiramos vida uns aos outros por causa do morango – o dinheiro. E de novo perguntamos quem são essas hienas que sorriem? Se quem se diz apoiar o país “prostitui” o povo, agita extremismo. Dão-nos balas que matam. E quem ganha? São as hienas.
Todos ambiciosos, individualistas, extremistas e tantos outros terão que ser as hienas furdelianas que sorriem pelo cifrão. A isto chamaríamos, pobreza de espírito.
“AS HIENAS TAMBÉM SORRIEM”
As Hienas Também Sorriem: Um efeito dominó para muitas “classes”
As Hienas Também Sorriem é o mais recente brinde literário do Contista e dramaturgo, representativo da novíssima prosa moçambicana, Aurélio Furdela. O livro não é feito só de contos, assim como de canções de angústia sadicamente cantadas por diversas forças vivas da sociedade.... Isto porque as fábulas da obra retratam o dia-a-dia de qualquer moçambicano, é como se de Marrabenta clássica de Moçambique se tratasse. Uma Marrabenta que exaltação das nossas vitorias e desgraças.
Por outro lado, o livro remete-nos a hipocrisia caracterizada pelo sentido metafórico do seu título, As Hienas Também Sorriem. Pois bem, como é possível? Hienas seres selvagens tão perigosas, sem humanismo possível para sorrirem, mas que na prosa “cronística” Furdeliana aventurada nos contos, vão mostrar os seus perigosos dentes.
Na nossa óptica a abordagem de Aurélio Furdela não é essencialmente uma carta de amor aos doutores deputados, porque o efeito dominó é extensivo à muitas classes. Quantas vezes não vimos gente falsa com sorriso largo, a engatar inocentes pelo cifrão, padres que estupram crianças, jornalistas que vivem de comissões, ganância assassina que leva os médicos a abandonarem os doentes, meia a volta, estas todas classes quando o assunto é a protecção do estômago faz-se de vitima, e num outro ângulo, finge um profissionalismo inexistente. E nós perguntamos quem são essas hienas que sorriem? É o que Roberto Chitsondzo chamaria de Katina P, ou seja, todos os esforços que se opõem ao desenvolvimento. Há aqui uma falsidade que mata, arrogância que mata, estupidez que mata, individualismo que mata, e esses actos macabros, quem leva a cabo? São de homens e mulheres desta terra libertada com suor, sacrifício e sangue. Não obstante, e me socorrendo na música Sathani dos “Bons Rapazes”, tiramos vida uns aos outros por causa do morango – o dinheiro. E de novo perguntamos quem são essas hienas que sorriem? Se quem se diz apoiar o país “prostitui” o povo, agita extremismo. Dão-nos balas que matam. E quem ganha? São as hienas.
Todos ambiciosos, individualistas, extremistas e tantos outros terão que ser as hienas furdelianas que sorriem pelo cifrão. A isto chamaríamos, pobreza de espírito.