Torna-se necessária uma política de alimentação ou política de ventre cheio, para garantir a estabilidade do país. Na verdade, antes de tudo e contra tudo temos de olhar a
sério pelo problema da alimentação rural,
porque uma população subalimentada ou defeituosamente alimentada é uma
população definhante, improdutiva, insusceptível de progresso e triste. Uma
população descontente é, por via de regra, mais inclinada à revolta silenciosa, à anarquia e à desobediência. Segundo o Correio da Manhã de 26.01.2015, citando o
Banco Mundial, é «“improdutiva” a força laboral moçambicana». Importa frisar
que o desfavorecido come alimentos que são insuficientes, muitas vezes na
quantidade mas quase sempre pelo valor energético, muito fraco, e bebe outros
que são nefastos não só pela sua toxidade, como pelos germes que transportam:
tais são as bebidas caseiras e as águas dos poços e dos pântanos de que faz
uso, correntemente. O problema alimentar é, para o desfavorecido, um mal, por
excelência. É neste mal que reside em grande parte a origem da sua fraqueza
física e muitas vezes moral, entregando-se ao consumo de bebidas para anestesiar
o espírito.
Não apenas o acto de beber mas até mesmo a embriaguez tem no
quadro dos usos e costumes dos nativos um lugar preponderante. Se se disser que
o pobre bebe nos momentos felizes e alegres, bebe nas ocasiões mais solenes da
sua vida, bebe quando a tristeza ou a adversidade o apoquentam – não se
pretenderá que se enuncia um facto peculiar a ele. Todas as raças e todas as
civilizações o fazem, com maior ou menor moderação. Mas o que já é próprio do
moçambicano é a maneira de beber, ingerindo espantosas quantidades de líquido,
e é, também, que quando bebe ele procura directamente a embriaguez, bebe para
se embriagar, e que, ainda, em certas circunstâncias, é de lei que a embriaguez
em que mergulha dure dias, semanas. Henri A. Junod explica-nos que há em Tonga
duas palavras para dizer beber. Uma é cu-nuá, outra é cu-qhueba. Esta última
traduz beber a pequenos golos, moderada, discretamente; é assim que o tonga, e
provavelmente os outros, bebem chá. O primeiro termo significa beber
sofregamente, a plena gorja. É deste modo que os nossos desfavorecidos bebem a
água e as bebidas alcoólicas. Nos bons tempos, quando a bebida abunda, eles
podem ingerir assim qualquer coisa como quinze a vinte litros por dia.
Muitos países se esforçam, presentemente, por ver resolvido o
problema da alimentação, procurando saber o que elas comem e bebem, e o que
deverão comer e beber para se tornarem seres saudáveis, fortes e produtivos. É
claro que a resolução deste problema depende de outros não menos importantes,
como o agrícola, o pecuário, o dos transportes, o dos aglomerados populacionais
rurais, de que falamos, anteriormente. Tenho sobre a minha mesa de trabalho
vários artigos escritos por pesquisadores que, no tempo colonial, se
interessaram pelos problemas de alimentação em Moçambique, com a colaboração de
químicos, higienistas, entre outros especialistas. Neles se apresenta, bem
documentado, o esforço que outros países despendiam para resolver o complexo
problema da alimentação dos desfavorecidos. Foi a sua leitura que me sugeriu a
oportunidade de me debruçar sobre o problema. É claro que a sua complexidade
exige estudos profundos. A opinião de que aqui se publica uma súmula não
pode tomar-se mais que à conta de subsídios. A apreciação científica do
problema, com a latitude que este requer, exigiria um quadro de operações e
análises que excedem o âmbito de opinião. Para começar, devemos apostar na
formação média dos nossos alunos através de ensino orientado para o ramo
agrícola. Por outras palavras, a expansão do Instituto de Investigação Agrícola
seria um primeiro e indispensável passo para uma completa investigação deste e
doutros problemas.
Baseando-nos nas condições físicas e humanas do país podemos
examinar a política agrícola actual e principalmente a que resulta da aplicação
do cultivo de culturas rendeiras. A imposição de culturas com fins meramente
económicos deve ser passada em revista. Não que defendamos a sua supressão mas
o acompanhamento da educação agrícola tradicional, ainda embrionária.
Infelizmente, há uma massa que prefere a miséria ao trabalho e até há
comunidades inteiras que preferem morrer periodicamente de fome a plantar
alguns hectares de víveres de reserva. Incentivar o plantio de árvores de fruta
diversa e que dê conforme as épocas do ano seria outro passo a ter em conta
para que, na falta de boa produção, o povo recorresse às frutas para suprir a
fome, e não só. Uma solução preconizada reside na fiscalização eficaz, e a
modernização das práticas culturais no quadro do sector. Dever-se-ia dar o
privilégio de organizar-se em cada aglomerado populacional, uma herdade
experimental que serviria de guia técnica da zona, tanto para os técnicos da
agricultura em formação nos institutos a expandir como para os camponeses
locais. A mecanização e importação de agricultores de outras latitudes
corresponde a uma necessidade. Nisto, as parcerias religiosas poderiam
desempenhar um papel de relevo, sobretudo, aquelas que se dedicam ao ensino. As
escolas secundárias poderiam, por exemplo, possuir uma herdade agrícola onde os
alunos poderiam ter contactos com as plantas.