No seu comentário sobre o meu
post com título «A
quem interessa a sucessão de Guebuza», Bayano Valy diz o
seguinte: «EU gostaria de saber como chegou à conclusão de que os que clamam
pela sucessão de Guebuza fazem-no a mando de interesses não nacionais? Acho
que até prova em contrário o ónus da prova deve ser por ti oferecida.
Ora, diferentemente de 2004 (mesmo em 1998/9 havia lido um
artigo com título «Chissano Refugia-se no
Povo») em que segmentos do povo comum se mostravam ansiosos em ter um novo
líder, actualmente tal cenário não é notório. Desde 2 de Janeiro que fui
recolhendo dados, aqui, acolá, além, entre Portugal-Qatar-Moçambique-Qatar-Portugal, num
estudo comparativo sobre a deslocalização dos benefícios sociais da cidade para
o campo e vice-versa, suas implicações nos mecanismos de transferência do poder em África: caso de Moçambique.
Em Moçambique recolhi dados em distritos de nove províncias exceptuando a de Cabo Delgado e nos municípios de Maputo, Manhiça, Xai-Xai, Chibuto, Inhambane, Vilanculos, Dondo, Beira, Gondola, Chimoio, Catandica, Tete, Moatize, Ulóngue, Milange, Mocuba, Gurue, Cuamba, Ribaue, Nampula, Monapo e Nacala-Porto. Para não me alongar vou ao essencial: Guebuza continua
popular (66,4%) - com uma margem de erro de 3.2% para mais ou para menos - entre os que há cinco anos se sentiam insatisfeitos com a
governação. Em termos representativos são: 89,2% dos que se dizem simpatizantes
da Frelimo; 52% para os apoiantes dos outros partidos, 58% dos independentes
e/ou que não revelaram a sua orientação política.
Do outro lado, temos estrangeiros vivendo em Moçambique há
mais de cinco anos e aí encontramos dados interessantes sobre a popularidade de
Guebuza: 75,6% para os estrangeiros africanos, 56,6% de estrangeiros europeus, 59,8%
entre os asiáticos, 47,4% de americanos, 45,7% entre os refugiados, 38,4% entre
os que perderam o estatuto de refugiado. Destes dados resulta que 53,9%
de estrangeiros acha que Guebuza devia continuar. Juntando as duas realidades vemos
que pelo menos 60,15% dos habitantes de Moçambique gostariam de ver Guebuza a
continuar, caso o mecanismo de transferência
de poder fosse pela Frelimo, repito, caso
fosse pela Frelimo. Por vezes, a Democracia é injusta!
Quando questionados da possibilidade da sua sucessão, por exemplo,
além da incerteza política 73%, ouvi respostas do tipo «isso é entre eles», «era
preferível que o povo fosse consultado porque lá na cidade não sabem o que nós
pensamos», «estamos cansados das decisões tomadas por baixo da luz», «já querem
cortar esse dinheiro que o distrito recebe», «deve continuar», «não me interessa», etc. e muitos
outros motivos que justificam mais a necessidade da sua continuidade do que do
seu afastamento.
A contestação era mais notória nas cidades e mesmo nestas,
entre os mais formados e até, como digo, entre funcionários públicos. Mas estes
últimos tinham características peculiares. Em geral, bons trabalhadores,
assíduos, cumpridores de seu dever, a maioria formada na instituição pública,
etc.. No final do estudo, defendo que a contestação urbana deve-se ao
facto de ter havido uma deslocalização dos benefícios económicos e sociais, o que resultou em desenvolvimento desequilibrado. O meio urbano foi o mais sacrificado em parte porque Guebuza liderou pessoalmente o desenvolvimento do meio rural deixando as cidades para os edis. Enquanto
nas cidades a ruralização avançou e com ela a pobreza urbana, no campo, os
hábitos urbanos foram surgindo e incorporados aos antigos desde o traje, passando pelo vestuário e alimentação até à
habitação e, em última instância, poupança de dinheiro em bancos.
Entre os contestatários a sucessão de Guebuza não figurava entre as suas prioridades; outros nem sequer se lembraram.
Pelo contrário, falaram do aumento salarial, do humilhante tratamento que
recebem nos hospitais públicos, da distância que lhes separa das sedes de poder local, dos centros de saúde e de escolas pré-universitárias; de capital para abertura de um negócio; dos
fertilizantes e das sementes; dos barcos e das redes de pesca; das propinas
para os filhos ou para eles na universidade; do dinheiro para
corromper uma parteira, um professor, um enfermeiro; de possuir uma torneira em
casa ou perto dela; de conseguir uma vaga de emprego, para formação, ou na
escola, para si ou seus dependentes, de conseguir um talhão para casa própria; de alimentação.
Quando analisadas as vias para a solução desses males, a
mudança de lideranças foi apontada, mas esta estava abaixo dos que sugeriram a
via de monitorização/fiscalização das actividades da parte do chefe máximo. Quer
dizer, a mudança a que se referiam era apenas sectorial e não da estrutura. Nos municípios
os mais criticados foram os vereadores e secretários dos bairros (88%) seguidos
de presidentes (86,5%). Algumas pessoas mostraram que nunca viram o presidente
do município!
Também os ministros não escaparam e sempre, analisados
em termos comparativos para a negativa ou para a positiva. Só por curiosidade, contrariamente
ao que tenho lido, nalguns municípios, o problema de transporte e de lixo está em
último lugar em relação ao de talhão, de água e de luz. Portanto, foi a luz disso e de
tantas outras curiosidades que cheguei à minha conclusão a qual, naturalmente,
é sempre contestável. Poderia ter dito muito, mas continuo a pensar que a sucessão de Guebuza, por enquanto, não constitui um problema nacional e que há interesses alheios por detrás da sua promoção, muitos deles tão intrínsecos quanto mister é o próprio tema mesmo dentro da Frelimo.
O que acontece, em geral, os políticos vivendo na cidade e sem desejo de lá sair, falam em nome de quem vive no campo não para melhorar a vida neste meio rural, mas para garantir meios de viver bem na cidade. Entre as limitações do estudo, figura a questão temporal, dada a distância que o separa do pleito eleitoral sucessório e, devido as mutações dos próprios fenómenos sociais.
O que acontece, em geral, os políticos vivendo na cidade e sem desejo de lá sair, falam em nome de quem vive no campo não para melhorar a vida neste meio rural, mas para garantir meios de viver bem na cidade. Entre as limitações do estudo, figura a questão temporal, dada a distância que o separa do pleito eleitoral sucessório e, devido as mutações dos próprios fenómenos sociais.
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