sábado, 30 de janeiro de 2016

Primeiro Grupo da Frelimo que recebeu Treino Militar na Argélia (Janeiro - Julho de 1963)

Por 
Eusébio A. P. Gwembe

O regime colonial tinha identificado alguns homens tidos como «entusiastas da guerra»: Uria T. Simango, Marcelino dos Santos, Leo Milas e Filipe Magaia. Foram estes que se esforçaram a incutir nos restantes nacionalistas a ideia de uma luta armada. Há informações de que antes da primeira leva, pequenos grupos iam para diversos países onde faziam treinos militares, sem causar alarme para o regime colonial, embora soubesse destas movimentações. «Todavia, quando a seguir a partida para o Cairo de um dos últimos pequenos grupos (Dezembro de 1962), se anunciou a futura ida de contingentes em massa, convenceram-se muitos de que afinal se não tratava já de brincadeiras, para alimentar o fogo sagrado da propaganda e da política, mas sim de coisa a sério». A Constituição do Primeiro Grupo da Frelimo que recebeu Treino Militar na Argélia (Janeiro - Julho de 1963) era composta por 50 indivíduos dos quais 37 (74%) instruendos de Cabo Delgado; 7 (14%) de Gaza, 3 (6%) de Sofala e igual número de Maputo. Entre eles estavam agentes que serviam de «olho do Governo do Tanganhica» que, por sua vez e de forma indirecta, «era olho da PIDE». A prova, é a lista em anexo cujo remetente afirmou que «Depois de regressar continuei a receber o que estava a ser pago pelo Governo do Tanganyika, antes da minha ida a Argélia. Aqueles que, como eu, tinham família, o pagamento nunca foi suspenso durante a ausência para treinos».
O grupo para treino militar foi preparado por João Munguambe, ajudado por Leo Millas, Lourenço Mutaca, Filipe Samuel Magaia e Silvério Nungu. Para o efeito, João Munguambe chamava cada um ou em grupo dos que tinham sido previamente seleccionados para comunicá-los. Os que não concordaram, debandaram para casa de familiares ou de amigos; outros regressaram à terra. O primeiro grupo saiu de Dar-es-Salaam no dia 13 de Janeiro com destino a Nairobi, via terrestre, com paragens em Morogoro e Moshi para refeições. Em Nairobi foram conduzidos ao aeroporto e num jacto da United Arab Airlines seguiram para Argel com escala em Cairo e Tripoli. Chegaram no dia 16 a Argel. Leo Millas e Filipe Magaia que auxiliará na instrução do grupo de que era chefe os acompanhavam.  Foram alojados em duas camaratas num quartel e receberam sapatilhas, camisolas, um par de cuecas, um par de meias, dois fardamentos e uma camisa. De autocarro seguiram para o quartel da cidade de Oran onde receberam dois sabonetes, cobertores, cinturão, cinto, cartucheiras, mochila, cesto, pano de tenda individual. Depois, seguiram para o Quartel de Mornia, na fronteira com Marrocos. O treino foi intensivo, com exercícios práticos e aulas teóricas, técnicas e de aprendizagem de Francês. Na primeira semana praticaram os exercícios físicos; judo, corrida, saltos, transposição de barreiras e obstáculos, football que prosseguiram a intervalos durante toda a formação. A segunda semana incluiu exercícios de natação para todos; nomenclatura, mecânica e manejo de espingardas; para a terceira semana entraram com os exercícios de tiro, a alvos distanciados de 50 a 300 metros, em progressão de 50 em 50 metros, e prostrados na linha de tiro, em grupos de seis atiradores ao mesmo tempo. E foram sendo introduzidas novas aprendizagens, acompanhadas de revisões. Havia uma grande variedade de engenhos e armas, ligeiras e pesadas, não automáticas, automáticas e semi-automáticas. O programa do treino era de dois períodos diários; das 8 às 12 e das 14 às 17, excepto aos domingos que era dia livre. 
Na preparação para a sabotagem era recomendada a poupança, sempre que possível, das infra-estruturas, porque se tratava de bens materiais necessários na paz, quando ganha a guerra e obtida a independência. Por isso, o objectivo primeiro era a caça ao homem, a destruição sistemática dos seus veículos de transporte. Os conhecimentos dos instruendos em francês não estavam a altura do treino. Era Filipe Magaia que traduzia em Português aos chefes de grupos; estes transmitiam-na, de seguida, em Português aos chefes de peça e de equipa que, por sua vez, ou em Português ou em língua nativa (suahili ou maconde), a transmitiam aos instruendos. Foram seis meses de treino sob orientação de capitão, sargento  e ajudantes argelinos. Dos  50 instruendos, foi retido um grupo dos primeiros quinze da lista abaixo, a fim de se especializar em transmissões e muito especialmente em rádio-comunicações. Numa entrevista conduzida por OLÍVIA MASSANGOFeliciano Gundana, o 4º na lista, explicou outras razões nestes termos: Eu havia estado na Argélia, nos treinos militares, fui no primeiro grupo. Os treinos começaram em Janeiro e terminaram em Maio. Eu acabei por ficar lá, com o camarada Milagre Mabote, para recebermos os outros grupos. Ficámos lá mais um ano e só regressámos em 1964. fiquei na Argélia e participei no treinamento dos outros dois grupos que estiveram lá, como um dos intérpretes de francês para português, porque o treino era dado em francês. Eu viajei com Filipe Samuel Magaia da Beira até Dar-es-salaam. Estive com ele na Argélia, era o chefe do primeiro grupo, e, mais tarde, quando voltei a Dar-es-salaam, trabalhei com ele no Departamento da Segurança e Defesa» Jornal O País, 24 ABRIL 2012.
Os 35 seguiram para o aeroporto, aonde tomaram o avião «Comet» da East African Airways, fretado pela Frelimo e que fez percurso Argel-Nairobi na noite de 14 para 15 de Julho de 1963. Este mesmo avião no percurso de regresso conduziu o segundo grupo da Frelimo que foi treinar na Argélia, composto de 70 indivíduos (na realidade 68) que não teve contacto com os do primeiro grupo.
Eis a lista completa do grupo:

Constituição do Primeiro Grupo da Frelimo que recebeu Treino na Argélia (Janeiro - Julho de 1963)
Nome
Proveniência
1
Albino Estevão Anapyaila
Cabo Delgado
2
Albino Tomas Macavaca
Cabo Delgado
3
Bartolomeu Carlos Mbalica
Cabo Delgado
4
Feliciano Gundana
Sofala
5
Jacinto Sithole
Sofala
6
Jonas Rodrigues Chale
Gaza
7
João Eugênio Mchocho Ncuemba
Cabo Delgado
8
Ludovico Gaspar Tukawula
Cabo Delgado
9
Luis Anastácio Nobre Chilambo
Cabo Delgado
10
Lourenço Matola
Maputo
11
Mário Fernando Navilani
Cabo Delgado
12
Miguel Niquenti Sakoma
Cabo Delgado
13
Milagre Mabote
Gaza
14
Pedro Joaquim Sibindi
Sofala
15
Rafael José Pedro Mwakala
Cabo Delgado
16
Ali Juma
Cabo Delgado
17
Andre Mputa Walikalala Kulomba
Cabo Delgado
18
Antonio Chalalangasi Chapasa
Cabo Delgado
19
Baculu Simoni
Cabo Delgado
20
Bombarda Tembe
Maputo
21
Cartase Caetano Cumaco
Cabo Delgado
22
Cassiano Alato Nchawya
Cabo Delgado
23
Cristiano Pavão Damião Kunanengo
Cabo Delgado
24
Cristovão Tiago Mula
Cabo Delgado
25
Fernando Vasconcelos Mucavele
Gaza
26
Francisco Ludovico
Cabo Delgado
27
Frederico Antonio Almeida
Cabo Delgado
28
Gabriel Simeão Zandamela
Gaza
29
Hamisi Mohamed Ali
Cabo Delgado
30
Henrique Mandlati
Gaza
31
Hilario Candido Nekamwene Kwalembo
Cabo Delgado
32
Ibrahimi Abdullah
Maputo
33
Ibrahim Bakali
Cabo Delgado
34
Jameson Said
Cabo Delgado
35
João Alexandre Madunga
Cabo Delgado
36
José Covane
Gaza
37
José Frenando Napulula
Cabo Delgado
38
Jose Kaindi Jacob
Cabo Delgado
39
Lucas Elias Tiago
Cabo Delgado
40
Luis Assiam Cassiano
Cabo Delgado
41
Manuel Nagogo
Cabo Delgado
42
Mateus Chipanda Mtabuliwa
Cabo Delgado
43
Mulia Cristovão
Cabo Delgado
44
Omari Sultan Maulana
Cabo Delgado
45
Oreste Basilio Kalulu
Cabo Delgado
46
Oreste Juliao Nandanga Changala
Cabo Delgado
47
Tadeo Pascoal Muidumbe
Cabo Delgado
48
Valentino Mtumwa Sakusasa
Cabo Delgado
49
Vasco Musketo Matabele
Gaza
50
Zacarias Halawe Twalibu
Cabo Delgado

2 comentários:

  1. Acredito que neste primeiro grupo de 50 guerilheiros, poucos ainda estão vivos, mas mesmo assim, todos deviam ter a devida homenagem visto que foram os primeiros guerilheiros da Luta de Libertação de Moçambique.

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  2. Com certeza, o meu pai perdeu a vida sem nenhum reconhecimento e nós como filhos sem nada pra lembrar que foi defensor deste paid

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