Houve momentos em que
se purificavam as fileiras porque o golpe desferido de dentro é mais doloroso.
Até hoje, eu não me convenço que a Frelimo perdeu, de facto, eleições na Beira,
em Quelimane, em Nampula e no Gurue. Explico-me, historicamente. Depois dos
atentados do 11 de Setembro de 2001, aquando da mobilização mundial para a luta
contra o terrorismo, o então presidente dos Estados Unidos, G.W. Bush, disse:
“ou estão connosco ou estão contra nós”. Em certos momentos da vida nacional há
que ter atitudes claras. Os que se revoltam contra e os que se indignam em
defesa da Frelimo, cheios de boas promessas, esperam que venham formar a seu
lado os que com eles andaram muitas vezes em conciliábulos traiçoeiros.
Aproximamo-nos das eleições e Dhakama já acenou com o seu beijo de traição.
Para elas, uns lutarão na esperança de uma recompensa futura e outros o farão
em defesa de alguma conquista passada. É o normal concurso que move as paixões
para as causas políticas. Há um porém!
Sempre que a ordem
pública é perturbada, aparece – a lavar as mãos como Pilatos – colocando-se
fora da contenda, uma fauna especial que é, de todas as faunas que por essas
ocasiões se manifestam, a mais antipática, por ser a mais calculista e a mais
comodista. É a chamada NEUTRALIDADE dos que não se batem nem pró nem contra,
para, no momento próprio, fazerem dominó para os dois lados! Em todas as
contendas há neutrais. Houve-os já entre 1962-1974, 1976-1992 e em 2008.
Classes que tinham por obrigação erguer-se em pé de guerra para a defesa do regime
e organizações políticas que as mantinha e engordara ficaram quietas como
ninhadas de ratos espavoridos, a ver em que as coisas davam. Liquidado o pomo
do conflito que negociadores comandados por heróis à feição antiga, resolveram
em Lusaka, em Roma e na Beira, batendo-se como leões em defesa da sua causa, os
neutrais de então foram os primeiros a aderir, calculadamente. Declararam-se
pro-frelimistas, pro-renamistas e pro-MDMistas. Da sua atitude sem
classificação tiraram, esses elementos passivos, todos os proveitos, enquanto
os verdadeiros sacrificados eram afastados.
Se se tivessem batido
pelo regime e organização que haviam jurado defender, talvez as revoluções
teriam sido esmagadas na sua infância. Foi assim que entregamos BEIRA ao
Simango, não por mérito deste mas pelo nosso pacifismo ante os neutrais. Logo,
os verdadeiros vencedores tinham sido os que haviam ficado em casa, digerindo
pacificamente, numa neutralidade benemérita, o rancho que nunca falta a quem
tem tempo para evitar que lhe entre o esturro. Entre descerem a praça pública,
para serem fieis a palavra dada em defesa da Frelimo, e ficarem comodamente, a
esperar pelas frinchas das janelas, as fases da luta em que tinham prometido
imiscuir-se, preferiram, sem remorso, envolver-se corajosamente no mistério das
esfinges, para forçarem a vitória final a inclinar-se para um lado ou para
outro. Hoje, são militantes fervorosos do galo. É histórico que algumas pessoas
se revoltaram para restaurar o sistema político que haviam deixado cair e outros
para se incrustarem uma vez mais no poder, donde por via dos seus erros, se não
dos seus crimes, haviam sido expulsos. E os neutros apareceram sempre, como
camaleões mudando de cor conforme as conveniências, como emboscados que não
sabem qual o caminho que devem seguir – se o que leva a glória se o que pode
conduzir a cadeia!
Quantos estão em
condições de mostrar a cara pela Frelimo, pela Renamo, pelo MDM e pelos demais
partidos políticos? Aos poucos que ainda são visíveis, parabéns. O estranho é
que, depois das eleições de 2018 veremos os heróis da neutralidade ou, se
quisermos, os budistas da guerra, uma espécie de bonzos que nenhuma perturbação
agita, sugarem as forças da nação, da verdadeira nação, daqueles que em tempo
oportuno deram a cara. Serão eles, que ao final da jornada, reclamarão a
inclusão, a democracia, os valores nobres. Hoje, são os primeiros a encolher os
ombros se se lhes batem à porta, para lhes dizer que a hora de cumprirem os
deveres que perante a organização assumiram chegou. Foi a atitude que nos
fez entregar Quelimane ao de Araújo, associado ao facto de que também não
soubemos aproveitar o capital político daquele, quando Gruveta ainda era vivo.
Os bonzos agitam-se, descruzam as pernas, erguem solenemente a cabeça, alongam
os braços, espalmam as mãos, invocam a deusa NEUTRALIDADE e declaram que
ninguém logrará obriga-los a mover-se, seja para combater os que pretendem
derrubar o status quo, seja para obedecer a quem tem o direito de lhes dar ordens
e de os fazer marchar para as primeiras linhas, onde a sua presença é precisa,
para proteger a vida útil da sua organização, contra as investidas dos que
pretendam destrui-la. Assistimos à este filme em Nampula. Amanhã, eles irão
reclamar dos vencedores, quaisquer que eles sejam, o prémio que a sua
indiferença conquistou: a inclusão.
Mas dentro deles há um
pequeno grupo, o dos useiros e vezeiros. Chamemo-los de marombistas. Estes são
habilidosos. Tendo-se comprometido a colaborar nas revoluções, faltam sempre,
para a última hora seguirem a trajectória dos vencedores. Estão constantemente
atiçando aos demais a optarem pelo caminho da guerra, da destruição, da
desobediência, para, na hora dos tiros, se esconderem atrás dos smartphones.
Esses são os verdadeiros culpados de todas as perturbações sediciosas que têm
apunhalado a vida nacional nos últimos anos. São eles quem dão alento aos que
pegam em armas e veem para a rua dar tiros à doida, matando os seus concidadãos
como matariam perdizes e galos. Deixam que os ingénuos, os ambiciosos, os
obcecados pela ânsia de governar e os desorientados pelas convulsões de
estômagos, habituados a digerir raivosamente a Frelimo, vão para as barricadas
e para as encruzilhadas dar largas aos seus instintos perversos. Depois, ou
correm a vibrar-lhes o golpe de misericórdia, ou são os primeiros a aparecer,
de escudela em riste, a reclamar o prémio da sua felonia. Eles pedem para tomar
parte dos processos que não iniciaram e para os quais não emprestaram a
coragem. Que consideração merecem os neutrais, os bonzos, os amorfos, os
indiferentes que por este modo ou facilitam a vitoria dos aventureiros de todas
as categorias ou dificultam aos governos cônscios dos seus deveres a repressão
imediata da desordem e o castigo exemplar dos desordeiros? Gentalha e que falta
ao que deve ou que se compraz em alimentar as fogueiras revolucionárias,
tomando todas as precauções para não ser envolvida pelas labaredas do incêndio,
é por acaso digna da admiração, da estima, do agradecimento ou da confiança de
alguém? Claro que não.
Diante de todos os
opinion maker de todas as matizes ergueu-se uma barreira formidável, composta
por quantos não hesitaram um momento no cumprimento honrado da palavra dada.
Outros, que deviam fazer outro tanto, não deram acordo de si, senão para
apregoar a sua neutralidade. Será justo que, depois da batalha, se meçam todos
pela mesma bitola? Uns, sendo depositários da confiança da nação corresponderam
integralmente a essa confiança. Outros, estando ligados a quem lhes paga por
iguais compromissos, procuraram sofisma-los, remetendo-se a uma expectativa
benévola, com a qual contaram para não ficarem de mal com ninguém e, sobretudo
para não incorrerem no desagrado do poder que surgisse! Será de admitir que, em
nome da inclusão, a uns e outros se conceda igual consideração? Não! É claro
que a moral estaria ofendida. É essa moral que nos obriga a perguntar se quem
tem cartão vermelho tem o direito de se recusar a cumprir o seu dever, só
porque outros surgem a fazer o contrário daquilo para que os mantem! Esta
anomalia dos neutros é duma gravidade excepcional. A república tem de os
olhar pela janela porque quem não for pela ordem nos momentos em que a ordem
perigue é, com certeza, pela desordem, muito embora fique de braços cruzados, a
ver em que as modas param. O manto da neutralidade terá que desaparecer porque
bastas vezes se parece com a cobardia. E a Frelimo tem estado a pagar caro
aquilo que não devia pagar.
O momento que passa não
se presta a comédias para a Frelimo! Não estejamos dispostos a transigir com
comediantes, qualquer que seja a sua categorização ou o seu disfarce. Todos os
campos têm de ser extremados, definidos, perfeitamente delimitados. Para 2018,
ou connosco ou contra nós. Cada membro tem que tomar posição cedo, para animar
os militantes e mobilizar as massas para a nossa causa, que é justa e grande. A
Frelimo esta a passar por uma dolorosa provação, tão grande e tão intensa, que
se não fossem aqueles que no primeiro momento, leais e decididos, correram a
defende-la, ninguém sabe o nesta altura teria acontecido. As forças estranhas a
Grei estão a maltratar o povo, contando sempre com testas de ferro domésticos,
com sanções sob alegação de dividas ocultas, na esperança de vê-lo a
revoltar-se porque, segundo dizem em surdina, derrube-se a Frelimo primeiro que
a ZANU, o MPLA e o ANC, baluartes do nacionalismo do sul do continente, cairão
em dominó. Mesmo dividida, a oposição tem consciência do seu verdadeiro
adversário e faz tudo para desacreditá-lo dentro e fora. Tenho dito.
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